Artur Patuleia*

A avaliação do Ensino Superior - uma abordagem


A avaliação dos cursos de ensino superior foi instituída com o objectivo de estimular a melhoria da qualidade deste sistema de ensino, assim como de informar e esclarecer a comunidade educativa e não académica sobre o desempenho em diversos domínios das diferentes licenciaturas. Por outro lado, pretende-se que a avaliação possa contribuir para um crescimento ordenado e sustentado do sistema de ensino superior português, assegurando igualmente uma melhor intercomunicação entre as diversas instituições de ensino superior.
O Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas (CAFUP) tem como competência organizar e coordenar o processo de avaliação no subsistema universitário público e concordatário. Este órgão foi criado em 1995 segundo um protocolo entre o Ministério da Educação, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e a Fundação das Universidades Portuguesas (FUP), e conta com a participação de dois representantes dos estudantes.
Na prática, o CAFUP aprova o calendário da avaliação dos diferentes cursos ao longo de um determinado ciclo de avaliação. Por outro lado, o CAFUP aprova a constituição das diferentes Comissões de Avaliação Externa (CAE) tendo em conta a sugestão das Comissões Consultivas Temáticas (CCT). Posteriormente, a avaliação procede-se em duas fases: a auto-avaliação e a avaliação externa.
Na fase da auto-avaliação, as instituições realizam uma avaliação interna ao curso seguindo um determinado guião aprovado no CAFUP e homologado pelo ministério. Na fase da avaliação externa, a instituição é visitada pela CAE que prepara a visita tendo em conta o relatório de auto-avaliação. A CAE nas suas visitas pretende tomar conhecimento da realidade do curso, promovendo deste modo reuniões com os diversos intervenientes do processo educativo. A visita é orientada por um guião de avaliação externa que permitirá à CAE elaborar um relatório final tendo como base catorze campos de avaliação. A avaliação de cada um destes campos é realizada segundo uma classificação que varia entre o A (excelente) e E (insuficiente). As CAE elaboram posteriormente os relatórios finais de cada curso e um relatório de síntese global, que são enviados às instituições para efeitos de procedimento de contraditório.
Ao CAFUP afiguram-se importantes objectivos no futuro próximo. Sendo este ano o último ano do segundo ciclo de avaliação, é importante que se prepare de uma forma incisiva e sustentada o terceiro ciclo de avaliação. Dever-se-ão obter garantias explicitas por parte do ministério no que respeita à atribuição de verbas necessárias ao processo de avaliação, de modo a terminar com uma durabilidade dos ciclos de avaliação dependente das diferentes disponibilidades financeiras do ministério ao longo do ciclo. Só assim poderemos ter uma avaliação cuja calendarização objectiva e concreta permita corresponder aos desígnios inerentes à sua implementação.
O falhanço nos objectivos que se prendem com o processo de avaliação surge na maior parte das situações devido a uma divulgação mínima dos relatórios das CAE e pelo não cumprimento das suas recomendações. Na realidade, todo o processo de avaliação seja o relatório da CAE, seja o relatório de auto-avaliação, seja o processo de contraditório, deverá ser divulgado de uma forma mais abrangente à actual. Esta condição é imperativa para se atingir a interacção pretendida entre as instituições e o meio em que estão incluídas. Por outro lado, é a forma mais indicada de se tomar conhecimento público da realidade da instituição.
Outro ponto fundamental constitui o cumprimento das recomendações dos relatórios das CAE. Partindo do princípio da imparcialidade dos peritos das CAE e da sua forte qualificação científico-pedagógica, obviamente que tais recomendações deverão ser levadas a efeito. Caso contrário, poder-se-á cair num grave precedente que tornarão inúteis os objectivos de melhoramento da qualidade subjacentes à introdução do processo de avaliação.
A avaliação constitui uma das traves mestras para a concretização dos objectivos decorrentes da introdução do processo de Bolonha. A criação do espaço europeu de ensino superior só é possível com o estabelecimento de uma relação de confiança entre as diversas instituições que o constituem. A criação da Rede Europeia de Avaliação da Qualidade do ensino superior, promovida pela Comissão Europeia, permitirá que os processos de avaliação de cada país sejam conhecidos e que a sua validade seja reconhecida pelas instituições dos demais países. Estas condições são fundamentais para se impulsionar a mobilidade estudantil no espaço europeu, objectivo primordial da introdução do processo de Bolonha. A abertura à participação estrangeira no processo de avaliação constitui uma falha no sistema de avaliação português. Se bem que nos dois últimos anos do presente ciclo de avaliação estivemos perante uma participação por parte de peritos estrangeiros na totalidade das CAE constituídas, não é menos verdade que a maior parte são portugueses que exercem docência no estrangeiro, espanhóis que percebem a língua portuguesa, ou brasileiros. Esta situação verifica-se porque não há verba para traduzir os relatórios de auto-avaliação para a língua inglesa, e constitui um importante entrave à indicação plena de peritos estrangeiros para as CAE, que pelo conhecimento e perspectivas diferentes sobre o ensino superior contribuem de uma forma construtiva para as conclusões das CAE. Na realidade, nem os relatórios finais das CAE são traduzidos para a língua inglesa, afastando imediatamente a consulta estrangeira à qualidade do nosso sistema de ensino superior. Esta preocupação foi inclusive referenciada no relatório do Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior (CIPES), “Consequências Institucionais da Avaliação das Universidades Públicas”, sendo portanto uma das questões a levantar junto do ministério, que comparticipa em 90% os custos da avaliação.
A falta de abertura de Portugal à participação e consulta estrangeira do processo de avaliação deverá ser uma situação a inverter urgentemente. Se realmente queremos ter um sistema de ensino superior de qualidade nos dias de hoje, então, e mais importante que a sua respeitabilidade interna, deverão ser realizados os esforços que permita que o nosso ensino superior receba contributos plenos vindos do estrangeiro e que a sua qualidade seja reconhecida e credibilizada pelos nossos parceiros da sociedade do século XXI. Só assim estaremos à altura de uma sociedade cada vez mais competitiva dominada pelos desafios da globalização do conhecimento, da inovação tecnológica e dos mercados sem fronteiras.

* Representante dos Estudantes no Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas

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Entrevista a Artur Patuleia