Anabela Gradim

Mais um 25


Trinta anos passaram sobre as eleições para a 1ª Assembleia Constituinte, mais um sobre a Revolução de 74 que haveria de resultar na instauração da Democracia em Portugal, reconciliando-nos, pelo desenrolar do processo, com um destino europeu que sempre foi o nosso.

Pondo de lado a difícil questão de saber se nestas três décadas o que faltou foi aprofundar o «socialismo», a democracia, o liberalismo, ou o projecto da construção social europeia – questões candentes se pensarmos na resposta que daríamos hoje sobre o que é necessário «aprofundar» - centro-me na efeméride propriamente dita.
Não há que enganar – são mesmo 31. A esmagadora maioria dos alunos que a UBI recebe já nasceram após a Revolução, e alguns, embora menos, dos professores que aí ensinam partilham agora com os discentes essa característica. A efeméride, para esse grupo cada vez mais vasto que não a viveu directamente é uma curiosidade que tratarão com maior ou menor apreço, mas que, em bom rigor, não recordam.

Há uns tempos misteriosamente tinha caído o «R» das comemorações; várias outras coisas caíram entretanto, incluindo um governo, e pela primeira vez este ano reparei que um insensível fenómeno de apagamento acelerado estava em curso. Pois não é que o feriado já parece tão anódino, tão afastado de nós, como o da implantação da República? Espero que esta impressão que é minha não esteja demasiado marcada pela subjectividade. Ela chega através de pequenos sinais, como por exemplo ter passado o dia em viagem, em zapping incessante no rádio do carro. Que esperava eu? Pois esperava o natural, que afinal deixou de ser, ouvir aqui e ali alguma música de intervenção, que se associa à data mas também tem qualidade musical intrínseca que faz com que seja agradável revê-la. Ora as ondas hertzianas neste feriado brindaram-me com mais do mesmo. A mesma playlist, exactamente a mesma, da saison Primavera-Outono 2005: Evanescence, 3 Doors Down, Skank, Humanos, ah, e os inenarráveis, inconfundíveis Queen, seguidos de Supertramp, porque algum fabricante de playlists imaginou que os jarretas da minha geração querem ouvir Queen quando ligam o rádio. Em relação a este ponto específico, deixo um recado: não, não e NÃO, ninguém quer ouvir isso, nunca mais.

Quanto ao 25 propriamente dito: nem um tema de Zeca Afonso a evocar a data pelo éter. Em vão torturei a Antena 1 – a do serviço público – e sempre que por lá zappei, nada, um confrangedor nada. Era, portanto, um dia como outro qualquer, de feriado-tipo-ponte, ainda por cima com bom tempo.

É para mim óbvio que este acumular de sinais, ou falta deles, não faz parte de uma conspiração nacional contra a efeméride. São apenas sinais dos tempos.

A dúvida que me tortura hoje, a 26, é se são bons ou maus sinais. Teorias há-as para ambos os gostos: do apocalíptico «abortaram a revolução», até ao pedagógico-modernaço que garante ser esta a marca da maturidade do regime.

Mas entre um e outro, ainda não me consegui decidir. Que significam estes sinais? Não sei. Não sei e na dúvida («os povos que esquecem a sua história estão condenados a repeti-la») quis partilhar aqui o meu espanto.