Por Catarina Rodrigues e Eduardo Alves





Segundo Luís Carrilho "temos de maximizar o período lectivo"

Urbi et Orbi - Quais as principais funções que desempenha no cargo de vice-reitor?
Luís Carrilho -
Desde o primeiro mandato como vice-reitor, este é já o terceiro, a área que me está mais afecta é a dos programas internacionais, quer o Sócrates, quer o Erasmus. Neste último mandato tenho estado também a tratar da questão dos Serviços Académicos, que julgamos ainda não estarem conveniente e academicamente organizados para os serviços a que estão destinados. Estou também ligado à questão da avaliação dos cursos. Todas as licenciaturas foram avaliadas por organismos exteriores, o que levou a que também nós, internamente, promovêssemos a nossa avaliação.

U@O - Que resultados têm sido obtidos nesse âmbito?
L. C. -
O balanço é muito positivo. Temos vindo a privilegiar uma avaliação sistemática de tudo o que se faz na instituição para depois, os resultados e as conclusões dessas mesmas análises passarem para a prática. Esta é uma opção tomada no sentido de se praticar aqui uma cultura de qualidade, e para isso é preciso termos indicadores. É preciso que os alunos avaliem os professores e o seu próprio curso. A UBI neste ponto também já deu mais um passo em frente no sentido de introduzir os questionários on-line, que desde o passado ano, têm de ser preenchidos pelo aluno para que este tenha acesso à sua ficha de identificação e ao seu perfil. Nesta altura, o índice de preenchimento é muito bom, chegando aos 3 mil alunos. Com este preenchimento on-line, os docentes têm um acesso imediato à sua avaliação e podem analisar e corrigir o seu desempenho. Com estes inquéritos e avaliações temos verificado que os alunos são muito conscientes. Se algo está mal é apontado pela maioria e de facto há algo ali a corrigir.

U @ O - A UBI tem vindo a apostar cada vez mais nos programas de intercâmbio de alunos. Que vantagens encontra a instituição nestas acções?
L. C. -
Fomos das primeiras Universidades a entrar no Programa Sócrates que era feito através de Projectos Integrados de Colaboração. A princípio isso era algo que se passava mais ao nível dos docentes. Depois a iniciativa foi alargada aos alunos. Com o aparecimento do Erasmus e do Sócrates, surgem também programas de intercâmbio que contemplam bolsas de apoio e protocolos entre as instituições. Ainda assim, de início, os estudantes estavam muito receosos em arriscar nestas iniciativas. Uns por causa da língua, outros porque eventualmente, perderiam algum tempo na finalização da sua licenciatura, enfim, era muito complicado encontrar alunos dispostos a ir passar algum tempo a universidades estrangeiras. Mas depois surgem os mais aventureiros e esses quando voltam e começam a relatar as suas experiências e aventuras promovem um “contágio” a todos os outros. Hoje em dia, temos de fazer uma selecção dos alunos que vão integrar os programas de intercâmbio, pois há muita procura. Este ano introduzimos uma prova de inglês ou francês para servir de selecção.




"Fomos das primeiras Universidades a entrar no Programa Sócrates"

U@O - O Processo de Bolonha prevê mudanças estruturais no Ensino Superior. Como está a UBI a adaptar-se a essa transição?
L. C. -
Neste momento temos também a Comissão do Processo de Bolonha que tem vindo a reunir e a tentar uniformizar o conhecimento sobre todo este processo. Eu estou a analisar e a redigir documentos com base em agências de acreditação de cursos a nível europeu, desde projectos conjuntos que têm dado algumas orientações sobre o que será Bolonha. Sobre esta matéria decorreram já três reuniões de alto nível entre os vários ministros europeus com o intuito de saber como estavam a ser implementadas as medidas previstas no processo. Na última reunião, que ocorreu em Maio, verificou-se que Portugal está muito atrasado na passagem das medidas previstas nos documentos. Neste momento já devíamos estar já a implementar calendários escolares, sistemas de aprendizagem centrados no aluno, etc.

U@O - É defensor de um calendário escolar sequencial. Porquê?
L. C. -
O período de interrupção entre o ensino e a avaliação deve ser reduzido ao mínimo. Se espaçarmos muito a aprendizagem e a avaliação, o desempenho não vai ser o mesmo, isto é algo que está provado. A nível europeu estão estipuladas 1600 horas de trabalho durante um ano lectivo, entre aulas, provas, exames e outras actividades. Sou apologista de que devemos maximizar o período lectivo. Se temos 16 ou 17 semanas de aulas e nesse período vamos ter de integrar todos os processos relativos às licenciaturas, então faz todo o sentido o calendário sequencial. Este sistema dá mais eficácia ao Ensino e ao aluno. Isto vem um pouco contra o que é praticado no regime clássico e que foi algo “abandalhado”. Veja-se que com o actual regime de avaliação e calendarização de exames, o aluno pode fazer exames a disciplinas que já não têm grandes ligações sequenciais com o esquema próprio do curso.

U@O - No próximo ano podem-se já esperar mudanças na calendarização das actividades lectivas?
L. C. -
Sim, mas de forma gradual. Bolonha prevê essas mudanças, no sentido de se aplicar uma avaliação sequencial, mas as mudanças operadas neste domínio, como muitas outras, terão de ser feitas com calma. Neste momento temos três meses de exames, se no próximo ano conseguirmos encurtar esse tempo para dois meses e meio já é uma modificação, ainda que os alunos não a sintam de forma grave. É esse tipo de alterações que devemos promover. No próximo ano, todas as áreas, inclusivamente a das Artes vão ter o mesmo calendário de exames. Essa é uma mudança, a uniformização dos calendários. Posteriormente, vamos tentar encurtar mais o período dos exames e outras actividades.



"Devemos maximizar o período lectivo"

"No próximo ano, todas as áreas vão ter o mesmo calendário de exames"

U@O - As engenharias foram um pilar fundamental na UBI desde a sua criação. Como vê o estado desta área na actualidade? A nível de equipamentos, corpo docente, saídas profissionais, número de alunos….
L. C. -
Esta Universidade é, por características próprias, muito sensível, mas também muito forte. Tem um corpo docente bem qualificado, um campus que oferece condições muito boas aos seus alunos, bons equipamentos informáticos e outros pontos de relevo. Julgo que neste aspecto poderemos mesmo considerar a UBI como uma Universidade modelo.
Precisamos de encontrar algumas soluções e ajustes para a parte mais sensível que aqui compreende a localização geográfica, que nos afasta um pouco das regiões onde há mais população. Outro aspecto importante prende-se com a captação de alunos. Em Portugal existe um comodismo no que diz respeito à movimentação de estudantes e de pessoas. É muito mais difícil resolver os problemas da falta de alunos nestas regiões do que junto às grandes cidades. Contudo, estes são pontos sensíveis, não fracos, daí que tenham resolução.

U@O - Como se pode justificar o decréscimo de alunos que tem ingressado em cursos de engenharias?
L. C. -
Há pouco tempo li um artigo de opinião onde se defendia que no Ensino Secundário se deveriam ajudar mais os alunos a obterem boas notas. Não digo o contrário. O problema do facilitismo é que depois se regista o ingresso no Ensino Superior de estudantes mal preparados e as Universidades também não estão preparadas para este tipo de situações. Daí que os ministérios em causa, as próprias Universidades tenham de ponderar estes acontecimentos e mudar algo. A fuga de alunos a que hoje se assiste na área das engenharias é um “imitar do mal”. Isto porque as pessoas sabem bem que a estrutura social e a necessária alteração desta apenas surge com pessoas ligadas a estas áreas.

U@O - E em particular, o exemplo de EPGI ou Engenharia Têxtil?
L. C. -
Estes cursos não estão encerrados. Os alunos que estão a frequentá-los vão terminar normalmente a sua licenciatura. Ainda assim, ao estarmos a alimentar essas licenciaturas podem surgir, de novo, falhas graves. Mas veja aqui o exemplo do Politécnico de Castelo Branco que vai encerrar uma licenciatura em Engenharia Florestal cujos licenciados têm emprego certo. Num País como Portugal, com necessidade de recursos humanos qualificados nesta área, verifica-se assim mais um retrocesso.

U@O - Quais as medidas que a UBI pensa implementar para atrair mais alunos?
L. C. -
Apostamos em vários domínios, mas para além da Internet e dos meios de divulgação tradicionais, a UBI tem de apostar numa marca exterior forte e muito própria. Uma imagem positiva e exigente que já tem e que se deve manter. Cada vez mais, as escolas são escolhidas de acordo com o seu grau de exigência. Uma escola onde se trabalhe e onde os alunos se sintam motivados, como na UBI, apresenta muitas mais potencialidades. Deve apostar-se também na diferença. O que é que um aluno que vem estudar para a Covilhã pode ter a mais do que um que estude em Lisboa? Boas condições de vida, boas estruturas de apoio ao Ensino, equipamentos, laboratórios bem apetrechados, uma cidade amena, bons acessos e toda uma centralidade. Hoje, com a auto-estrada a Covilhã fica a duas horas de Lisboa, a outras tantas do Porto e de Coimbra, e muito próxima de Salamanca, na vizinha Espanha.





Perfil



Luís Carlos Carrilho Gonçalves nasceu no Soito, concelho do Sabugal a 16 de Julho de 1951. Casado e pai de dois filhos, reside agora na Covilhã, localidade a que está ligado desde cedo, sobretudo por laços profissionais.
O início nos estudos foi feito na aldeia do concelho raiano onde o pai exercia medicina. Com dez anos muda-se então de armas e bagagens para o Liceu Nacional da Guarda. Este liceu, “na época, um dos mais reputados do País”, vai ser uma das principais marcas da sua vida académica. Carrilho Gonçalves recorda perfeitamente, a cidade da Guarda daquele tempo, “das poucas no interior do País onde existiam edifícios com mais de um andar”.
Os métodos de ensino e as pedagogias aplicadas então “eram bem diferentes das actuais”. Os professores “muito mais exigentes, mas também conscientes de que os alunos tinham de aprender verdadeiramente”. Aluno destacado, começa por dispensar os exames, “pois as notas conseguidas durante o ano davam para esse privilégio”, e termina com 16 valores o Curso Geral dos Liceus. Opta então pela carreira na área tecnológica.
Em 1969 ingressa no Instituto Superior Técnico (IST), em Lisboa, no curso de Engenharia Mecânica, onde depois segue o ramo de Termodinâmica Aplicada. Quando fala na sua passagem pelo Ensino Superior recorda “a época de efervescência e convulsão” que se viveram naqueles anos. Em 1969 “já o regime estava em decadência e era através das Universidades e dos seus alunos que se travavam grandes lutas contra o fascismo”. Toda esta loucura que mediou a Revolução dos Cravos fez com que perdesse um semestre lectivo, não por faltas, “antes pelo contrário”, porque o IST, “como uma das escolas mais reivindicativas, foi encerrado pelo polícia durante esse tempo”.
Nos últimos anos da licenciatura desempenha funções de monitor ajudando os professores da instituição nas aulas dos alunos dos primeiros anos. Esta função vai depois conduzi-lo ao lugar de “assistente eventual”, assim que Abril liberta o País do regime. É já com este cargo e ainda no IST que ganha o seu primeiro salário, “3 mil e 500 escudos, o ordenado mínimo da época”. Com esta quantia “comprei uma aparelhagem, era algo de que gostava muito na altura”, recorda entre risos.
O projecto de integrar o Instituto Politécnico da Covilhã (IPC) surge através do convite do então reitor Passos Morgado e também do actual reitor, Santos Silva, que já tinha sido colega de liceu. Um certo desejo de “regresso às origens” e a vontade de abraçar um projecto que estava então a dar os primeiros passos fazem com que Luís Carrilho aceite e convite e entra no grupo de docentes do IPC.
Aqui colocava em prática todos os conhecimentos que tinha então adquirido. Com a falta de professores que se verifica então, um pouco por todo o País e mais nesta região, “leccionávamos cadeiras de diversas áreas que não só as nossas. Tudo aquilo que tínhamos aprendido durante a licenciatura era aqui aplicado”. Mas o primeiro grande desafio que lhe é proposto na UBI vai no sentido de instalar e equipar os laboratórios de Física. A esse ponto acrescia o facto de estes espaços não serem somente dedicados à Física, pois tinham de servir também para as áreas das engenharias. Depois de “um trabalho muito árduo, quer ao nível do contacto dos representantes dos equipamentos, quer a nível orçamental, conseguimos montar laboratórios que estavam a um nível superior aos do Técnico de Lisboa e mesmo da Universidade Nova”.
Ainda assim, por essa altura, meados dos anos 80, as directivas do Estado, para esta escola eram muito restritas. Nunca se pensou que a UBI chegasse ao que está hoje. Em 1981 concorreu a uma bolsa da OTAN/NATO, para estudar fora do País. Consegue também uma bolsa da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) no Cranfield Institute of Technology, no Reino Unido, onde obtêm os graus de “Master of Science” e “Doctor of Philosophy”. Torna-se assistente no Departamento de Física do Instituto Universitário da Beira Interior, em Outubro de 1984, passa a professor auxiliar deste organismo e em Julho de 1995 chega a professor associado já da Universidade da Beira Interior (UBI). Pelo caminho, ainda tem tempo para assumir a presidência da Comissão Instaladora da Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico da Guarda, em acumulação de funções com a actividade de docente e presidente do Conselho Científico da mesma instituição. Prestou provas de agregação à UBI a 3 de Junho de 2003. Passou, entre outros, pelos cargos de presidente do Departamento de Electromecânica e do Conselho Pedagógico. Foi pró-reitor e é actualmente vice-reitor da instituição.