António Fidalgo

A pós-graduação em Portugal


Há quem se sinta perdido com a introdução dos novos graus académicos em Portugal, nomeadamente com o facto de um estudante do ensino superior ficar com o grau de licenciado ao fim de 3 anos e com o de mestre ao fim de 5. Alguns dirão que 5 anos era o tempo normal de uma licenciatura até há bem pouco tempo e a verdade é que temos ainda muitas licenciaturas de 5 a funcionar (nomeadamente as de engenharia). Estamos perante uma inflação de graus? Em parte, sim. Se ligarmos apenas aos anos passados na universidade, um licenciado antigo equivalerá a um mestre novo e um licenciado novo a um bacharel antigo.

As coisas, porém, não se resumem a mudança de nomes. O que acontece é que com as mudanças em curso o tipo de ensino universitário altera-se, nomeadamente, tornando os alunos muito mais responsáveis pelo seu percurso académico. Por outro lado, a pós-graduação passa a ser uma regra em qualquer universidade e não apenas um elemento tão raro quanto adicional.

Comecemos pelo primeiro factor. O ensino superior em Portugal estava demasiado escolarizado. Um aluno tinha de fazer uma série de disciplinas, tal como no ensino secundário. Ora não é esse o espírito universitário. Deve-se assumir integralmente que o aluno universitário atingiu a maioridade, que ele é responsável, e que, portanto, deve caber-lhe a tarefa de em conjunto com os seus mestres delinear o seu percurso formativo. Tem de escolher o que quer aprender, estudar, investigar, fazer, praticar. Assume a responsabilidade pelas escolhas que fizer, e será avaliado por isso. Este é o ponto essencial: a responsabilização do aluno. Por isso é que nas reformas curriculares em curso, obedecendo ao espírito de Bolonha, os alunos deverão ter menos horas de aulas e muito mais horas de estudo. No célebre paper sobre a excelência das universidades portuguesas , o Prof. Michael Athans, comparando o Técnico e o MIT, referia o excesso de carga horária e de matérias leccionadas em Portugal, entre 7 e 8 disciplinas, e o exagero de horas semanais de aulas, de 20 a 30. No MIT um aluno em norma tem -- em engenharia! -- 12 a 15 horas. Os estudantes universitários portugueses têm de se habituar a trabalhar por si, numa palavra, a responsabilizar-se.

Segundo aspecto. Em Portugal não havia uma tradição de pós-graduação. Os doutoramentos eram, e ainda são, qualquer coisa do outro mundo, longos, exigentes, só para os eleitos que queriam mesmo fazer carreira académica. A criação dos mestrados em princípios da década de 80 foi uma maneira, tardia, de arranjar uma pós-graduação intermédia, de criar uma ponte entre a habitual licenciatura e o doutoramento a fazer lá para o fim da carreira universitária. Este era como que a coroação de um percurso académico. Lá fora os doutoramentos são muito mais fáceis, acessíveis. Aliás, não é por acaso que há muitos recém-licenciados portugueses a fazer o doutoramento em Espanha e não temos espanhóis a fazer o doutoramento em Portugal. A criação de três ciclos de estudos superiores em Portugal vem colocar o nosso sistema de ensino universitário a par dos sistemas habituais no estrangeiro. Apenas isso.

Com esta mudança de graus pode ser que aconteça outra mudança positiva: o fim da doutorice em Portugal.