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Primeiro estranha-se, depois entranha-se
Ana Duarte e Sofia Rustrian Fonseca · quarta, 16 de agosto de 2017 · UBI A Covilhã é por vezes desvalorizada pela sua localização e alguns acreditam que nela não há futuro para os jovens. Na realidade, não é bem assim. A UBI acolhe anualmente alunos de muitos pontos do país e do mundo, em quem a Covilhã deixa marcas positivas. |
A Universidade da Beira Interior é hoje o "motor" da cidade da Covilhã |
21985 visitas Começa mais uma semana na nova vida de Laura, de 24 anos. Há dez meses que decidiu deixar o Brasil, após ter terminado a licenciatura em Comunicação Social na universidade de Santa Cruz do Sul. O seu sonho passava por conhecer o mundo e as diferentes culturas e então decidiu vir estudar para Portugal, devido à sua localização estratégica e fácil acesso a outros países. Inicialmente, a aluna do mestrado em Jornalismo pensava frequentar a universidade do Minho, mas após longas conversas com uma amiga brasileira, ex-estudante ubiana, acabou por mudar os seus planos. “A primeira vez que eu entrei na UBI, eu acabei por me perder, literalmente. Com tantos corredores, e bem diferente do que estava habituada no Brasil, eu consegui demorar 45 minutos a encontrar a casa de banho e regressar para o sítio onde me encontrava . Ainda hoje a UBI consegue ser um mistério para mim”, conta a estudante. A afluência de estudantes internacionais tem vindo a ser cada vez maior e a extravasar em muito o programa Erasmus. No ano letivo de 2016/2017, a UBI, segundo o seu relatório de atividades, acolheu 1011 estudantes vindos dos quatro cantos do mundo para integrarem os vários ciclos de estudos. Atualmente, os estudantes internacionais representam 14,4% do total do corpo estudantil da universidade. Brasil, Angola, Espanha e Cabo Verde são os países mais representados. “Com a mudança de estatutos no ano de 2013 / 2014, veio também a oportunidade de receber estudantes de outros países, e é graças a estes que temos conseguido manter ou aumentar o número de alunos que vêm para a UBI por ano”, explica João Canavilhas, vice-reitor para o ensino e a internacionalização . Comparativamente com os dois anos anteriores, a UBI aumentou em 1,5% o número total de alunos . Os estudantes nacionais foram, neste ano letivo, 6003 . “A zona do Norte, como Braga, Porto ou Vila do Conde, é a zona do país de onde vêm mais estudantes”, clarifica João Canavilhas. Paulo Ferreira tem 22 de anos e escolheu a zona da Cova da Beira para realizar a sua jornada académica. Está no quarto ano de Engenharia Aeronáutica e pertence também à Desertuna - Tuna Académica da Universidade da Beira Interior, que, segundo o aluno de Felgueiras, foi fundamental para a sua integração enquanto estudante. “O primeiro ano é sempre o ano mais difícil, mas também o mais importante do nosso percurso. É o ano em que iniciamos um dos capítulos mais importantes da nossa vida. Ainda me lembro do primeiro dia, como se fosse hoje. Estava aqui fora, com o meu pai, para fazer a matrícula. Depois da papelada, fui abordado pelos membros da antiga Associação Académica que me explicaram tudo o que tinha que saber. Senti logo que tinha feito uma boa escolha, pois nunca tinha sido tão bem recebido por alguém que não me conhecia”, conta Paulo Ferreira. A mesma certeza de ter escolhido o local certo não aconteceu com o colega de curso Dinarte Gonçalves. Após dois anos em Lisboa, este madeirense de 24 anos decidiu vir para a Covilhã exclusivamente por ser a única universidade com o curso que pretendia seguir. Dinarte via a Covilhã simplesmente como uma pequena cidade na Serra da Estrela e não tinha qualquer tipo de expectativas. O primeiro contacto com a cidade foi uma experiência estranha, pois a universidade era fora do comum. “Lembro-me de chegar cá para fazer a matrícula e pensar que eram só blocos, sem um aspeto apelativo. Mas acabei por descobrir que a UBI tinha uma história para contar, visto que sucede a uma Fábrica de Lanifícios. Sem dúvida que é algo único”, explica. Hoje, o aluno madeirense realça as diferenças em relação à capital, a qualidade da universidade e o espírito académico. ”Esta cidade faz-me lembrar um pouco da Madeira, com estas subidas e descidas. Faz-me recordar a minha casa”, diz o estudante de Aeronáutica. Do sul do país não vem muita gente para a UBI, mas existem exceções como Joana Mendes, de 21 anos, que até decidiu prolongar a sua estadia após se licenciar em Ciências da Comunicação. Hoje integra o mestrado em Jornalismo e considera esta cidade um “pequeno tesouro” a que chama segunda casa. “Acabou por me surpreender, não pelas expectativas, porque não trazia muitas, mas pelo facto encontrar inesperadamente uma das melhores universidades na minha área, onde acabei por aprender muito”. Joana foi um dos casos de jovens que “caíram de paraquedas” nesta pequena cidade, quase por obrigação. No entanto, hoje afirma convictamente que voltaria a fazer tudo da mesma forma. “Nunca outro sítio para estudar, nunca outro sítio para ter a vida universitária, nunca outro sítio para nada. Quem vem para a Covilhã é impossível ir embora e não ter um bichinho para voltar”, afirma a aluna algarvia. O miradouro das Portas do Sol é dos sítios que mais marcaram o seu percurso, pois durante estes quatro anos funcionou como “porto de abrigo”. “Vinha para aqui muitas vezes só para olhar para a cidade, para pensar e desabafar, no final da tarde ou à noite”, conta. A da Cova da Beira é das zonas com população mais envelhecida do país. O futuro económico da cidade, segundo João Canavilhas, reside nos jovens e nas oportunidades que estes podem criar. Sandro Reis, ex-aluno da UBI, hoje a trabalhar num grupo imobiliário, aponta as oscilações de movimento na Covilhã ao longo do ano. “Existem dois tempos completamente diferentes. No verão, a cidade morre, até porque está envelhecida, com pouco mercado de trabalho. Portanto, durante o verão é bastante pacata". Bruno Silva, taxista há dez anos na Covilhã, confirma que as diferenças são notórias. “A universidade é indiscutivelmente o motor de arranque da Covilhã. Movimenta bares, discotecas, papelarias, pastelarias e transportes públicos. Quando vêm as férias , é uma calma estranha, porque a cidade fica sem vida”, elucida. Sandro Reis acredita, porém, que os jovens valorizam a qualidade de vida, a segurança e o conforto. “O custo de vida é bastante baixo, é uma cidade onde todos se conhecem e se falam, e tem todos os serviços necessários para uma boa vida”. Margarida Ribeiro, técnica da Câmara Municipal e coordenadora do Centro de Ativ'Idades, onde a maioria dos voluntários são estudantes da UBI. acredita que foi graças à UBI que a comunidade covilhanense começou a abrir os seus horizontes, aprendendo a ser uma cidade acolhedora, pronta a ajudar o próximo. A coordenadora considera a presença dos alunos nacionais e internacionais como algo muito positivo, pois além de “ajudar a população que quer ser ajudada, transmitem-se ainda valores e ensinamentos que beneficiam ambas as partes”. “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”, ditado popular bastante conhecido, é uma das frases mais proclamadas por quem vem estudar para a Cidade Neve. Muitos vêm por obrigação e choram ao entrar, mas quando chega a altura de partirem, não querem abandonar a cidade que proporcionou os melhores anos da suas vidas . Aqui ficam as melhores memórias, os risos, as histórias por contar, os cafés tardios e os amigos que acabam por ficar para a vida. |
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