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             Acordem 
 
            A apatia está a apoderar-se do
            País. O "deixa-andar" é a expressão
            que se ouve, aqui e ali. O comodismo instala-se a olhos vistos.
            Ninguém assume responsabilidades e, o que importa, resume-se
            ao recebimento do ordenado ao fim do mês. Problemas? "Isso
            não é comigo". 
            A gravidade da questão assume ainda dimensões maiores
            quando se trata de participação em actos importantes
            da Comunidade. E quem sofre é evidentemente a democracia.
            Fugir aos problemas e deixar de exercer a cidadania a que temos
            direito, antecipa a doença das instituições
            e da sociedade. 
            A tendência para delegar nos outros a resolução
            de questões vitais cresce assustadoramente. Veja-se o
            índice de participação em reuniões
            locais da mais variada ordem para se concluir do afastamento
            dos problemas. E isto também se verifica a nível
            sindical, escolar e similares. 
            O facto da grande expressão mediática à
            contestação das resoluções governamentais
            da co-incineração não invalida a afirmação.
            A tempestade vai acalmar e uma solução, neste capítulo,
            impõe-se sem demoras para a saúde de todos nós. 
            Cada vez mais se torna imprescindível a educação
            cívica. No documento da CEP (Conferência Episcopal
            Portuguesa) intitulado Igreja na Sociedade Democrática
            e divulgado a 15 de Maio passado via internet pode ler-se: "A
            participação política torna-se mais natural
            se se der atenção peculiar à educação
            cívica, nas famílias, nas escolas, nas associações
            juvenis". A propósito, a CEP justifica a afirmação
            com uma citação do Vaticano II: "Para que
            todos os cidadãos possam exercer o seu papel na vida da
            comunidade política, deve dar-se uma grande atenção
            à educação cívica. Ela é,
            hoje, particularmente necessária, tanto para o conjunto
            dos povos, como, sobretudo, para os jovens. Aqueles que são
            ou podem vir a ser, capazes de exercer a arte difícil,
            mas nobre, da política devem preparar-se para isso. Devem
            entregar-se a ela com zelo, sem se preocuparem com o seu interesse
            pessoal ou com vantagens materiais". 
            A educação cívica revitaliza a democracia.
            Dá-lhe um "suplemento de alma" como dizia Bergson
            sobre o estado do mundo do seu tempo. Mas não é
            com frases para decorar que as novas gerações aprendem
            a educação cívica. A participação,
            de mãos dadas com os saberes fundamentais, em acções
            quotidianas comunitárias indica o caminho pedagógico
            mais eficaz. E a escola aqui ocupa um lugar preponderante. 
            Para além das aulas ou de uma disciplina específica
            que tem o seu cabimento, as intervenções no terreno
            tornam-se indispensáveis. A começar logo por volta
            dos sete anos de idade. 
            A criança começa a despertar para os valores. E
            a envolver-se em acontecimentos a que dará a importância
            devida. 
            A influência da televisão leva os cidadãos
            a viver emocionalmente muitos acontecimentos como espectáculos.
            Daí uma fuga das realidades concretas. Ou então
            como assinala o filósofo Popper, a televisão ser
            "ladra do tempo". E lá vem a desculpa da falta
            do tempo e a indisponibilidade para a acção cívica
            que cria novas exigências. 
            Qualquer um de nós tem obrigação de deixar
            um rasto na sua vida para os vindouros. O velho ditado diz que,
            para viver uma vida, é preciso ter um filho, escrever
            um livro e plantar uma árvore. Sem ter um filho, escrever
            um livro ou plantar uma árvore, um homem cumpre o destino
            a que é chamado. Basta deixar valores perenes à
            semelhança dos santos e grandes homens da História. 
            Viver no conformismo é uma janela para vazio. E a natureza
            tem horror ao vazio, segundo as leis científicas. Logo
            impõe-se preencher este vazio. 
            Acordemos do torpor que nos invade. De outra forma, - escreve
            o nosso Eduardo Lourenço - "vamos para o séc.
            XXI em carruagem-cama, indiferentes às tragédias
            do mundo e às nossas próprias. Os problemas caem-nos
            em casa já resolvidos. É o mundo que tem problemas,
            mas nós". 
            É possível lutar contra a apatia. Ser interveniente.
            Mudar o rumo das coisas. E desenvolver uma espiral de participação
            social. Sempre haverá problemas. Haja imaginação
            para os resolver. 
            Na promoção da educação cívica.
            E no dar dignidade à política. 
             
            *NC / Urbi et Orbi  |